A obrigatoriedade de fundamentação das decisões judiciais — prevista na Constituição Federal (art. 93, IX) e no CPC/2015 (arts. 11, 489 e 1.022) — constitui direito fundamental das partes e requisito essencial do devido processo legal.
Nesse contexto, chegou ao Superior Tribunal de Justiça a discussão sobre a validade da chamada fundamentação por referência (per relationem), técnica em que o julgador utiliza, como razões de decidir, fundamentos constantes de outra decisão ou documento, como pareceres e manifestações processuais.
No julgamento do Tema Repetitivo 1.306 (REsp 2.148.059/MA, REsp 2.148.580/MA e REsp 2.150.218/MA), a Corte Especial, sob a relatoria do ministro Luis Felipe Salomão, firmou entendimento de que essa técnica é admissível, desde que observados parâmetros específicos. Foram aprovadas duas teses:
- A técnica da fundamentação por referência (per relationem) é permitida desde que o julgador, ao reproduzir trechos de decisão anterior, documento e/ou parecer como razões de decidir, enfrente, ainda que de forma sucinta, as novas questões relevantes para o julgamento do processo, dispensada a análise pormenorizada de cada uma das alegações ou provas.
- O § 3º do artigo 1.021, do CPC não impede a reprodução dos fundamentos da decisão agravada como razões de decidir pela negativa de provimento de agravo interno quando a parte deixa de apresentar argumento novo para ser apreciado pelo colegiado.
O Min. Relator destacou que a fundamentação por referência deve ser utilizada de forma “integrativa” ou “moderada”, em que a remissão a decisão ou documento vem acompanhada de apreciação própria do julgador, em diálogo com os argumentos do caso.
Por outro lado, é inválida a fundamentação por referência “pura”, na qual há apenas a transcrição ou remissão integral de trechos, sem análise individualizada da controvérsia submetida ao Judiciário.
O Ministro Salomão também ressaltou que a exigência de fundamentação tem dupla função: garantir às partes a possibilidade de controle interno do julgamento por meio dos recursos adequados e permitir à sociedade o controle externo das decisões judiciais. Assim, a utilização da técnica não pode resultar em decisões genéricas ou arbitrárias, devendo preservar a transparência e a racionalidade do ato jurisdicional.
Ao fixar a tese, o STJ estabelece parâmetros para a utilização da fundamentação por referência em decisões judiciais, delimitando as hipóteses em que a técnica é admitida e aquelas em que pode configurar ausência de motivação. Aguarda-se a finalização e publicação do acórdão para a consolidação definitiva do entendimento.
Paulo Bezerra de Menezes Reiff – paulo@reiff.com.br
Raphael Henrique Figueiredo de Oliveira – r.figueiredo@reiff.com.br